reflexo

não sei onde vi a respeito de mim
em que livro, folha, pedra ou marfim
havia lá desse eu um retrato
sem cor nem forma, nem um acato

a descrição era imprecisa
mas detalhada e mui concisa
os olhos baços que me fitavam
se escondiam de dor e choravam

pareceu-me também ouvir vozes
como flechas de fogo velozes
luzindo à noite e incendiando
os campos, os meus sonhos matando

e de novo vejo a antiga imagem
refletida em pó e serragem
não sou eu! quem estará, quem, ali
me sondando? quem será que me vi?

(scs, 17210)

espelho

a criança se olha no espelho
e se vê adulta
no mundo de depois:
deveres, salário, contas,
voto, despertador, hospital,
decisões, atas, encanador,
promoção, tese, fumaça,
engarrafamento, dilema, solidão.

a criança quebra o espelho
e vai brincar lá fora.

(mc, 2599)

(fonte da foto)

Este poema foi um dos vencedores do concurso Poemas no ônibus, da Prefeitura de Porto Alegre. Veja aqui.
Em breve, atualizo as informações e lanço um concurso pros leitores.