sem título

o que era de fato
nem mesmo pensamos
no entanto sim estava
e por isso tão solene
como a noite e uma
gota de sangue ou lágrima
de toque macio e não
tão simples sendo assim
que surpresa já sempre
um anelo não uma ausência
de poucas cores mas doçuras
nem haveria em nenhum canto
o aroma de que fizemos
o outro sonho da alegria difusa
bem de manhã sem lençóis
piso frio caminha tonto
e florejam liláses a nuvem
miúda nos diz o Nome e
lembramos nada somos
só desejos e saudade

(sp, 25813)

chuva e saudade

tua
presença
chove
em
minha
saudade

chovem-me
as
saudades
desta
contínua
ausência

ausento-me
em
chuvas
de
saudade
chorosa

saudade
e
chuva
em
meus
olhos

saudosa
chuva
ecoa
abraços
ausentes
constantes

faz-me
chuva
saudosa
lembrança
de
amanhã

fluem
saudades
chovidas
sobre
olhos
secos

chuvas
antigas
inundadas
de
novas
saudades

saudades
antigas
uma
chuva
sem
fim

na
presente
chuva

toda
saudade

saudade
egoísta
tranca-se
na
nuvem
chuvosa

choram
saudosas
nuvens
em
doce
remorso


nuvens
sentem
saudade
da
chuva

notas
de
saudade
na
chuva
morna

noites
tontas
de
saudade
chovem
memórias

viam-se
saudosos
chuvas
intensas
nada
mais

tanta
saudade
chovida
em
cada
lágrima

ouvida
saudade
nas
gotas
tristes
chuvosas

vi-te
ainda
na
chuva
sem
fim

finda
chuva
foram-se
nuvens
perene
saudade

de uma real Distância e suas Dores

a Rafa e Tássia

I

de perto
amor
de longe
saudade

no todo
amor
quando partes
saudade

tua voz
amor
teu silêncio
saudade

sempre presente
saudade
sempre presente
amor

quando ausente
– amor
tua presença
saudosa

II

saudade
é uma sombra do amor:
está onde ele está,
mas quando não está;
é ele, mas não é,
mas é

se alimenta
de distâncias
de não-estar
dos acenos
que queríamos
proibidos

III

nos acenos
serenos tristes
com os quais
te vais

vem, assim, a ausência que
nenhum tempo mede
nem cura

amor
meio arte
saudade
meio morte

quando ficas
partes
em tudo
ficas
todo

IV

todas as distâncias
que são sempres
escoam lentas caudalosas
no tempo que se acumulou estático
no virar
de outro dia

e rememorar o aqui naquela ocasião
faz presente os ausentes
em lembrança e sorriso
– como o tempo voa
quando a gente começa
a relembrar

e talvez haja ocultos
fatos ainda não-inventados
desses que vivemos ou amanhã
muitos tantos que só podem ser
o restante da vida e outro tanto

e, ainda assim, o tempo leva muito tempo
pra passar

V

a estrada que se esconde sob a sombra
permanece muda como os risos de ontem

e avança na noite distanciando presenças
mergulhadas no silêncio que emoldura nós dois

vamos repetir a aventura ainda não vivida
de milhões de fotografias risos passos e aromas

repetiremos as convicções aninhadas em histórias
que são, que sempre serão estranhas e belas

e a saudade será sempre
nunca mais

(scs, 1115)

ampulheta

precisou, por enquanto, se ausentar,
mas não de coração

repousar uns tumultos sem pressa,
até que a saudade passasse silenciosa

e a maré deixasse a areia intacta
– pegadas já inexistindo desde sempre –

aos poucos, com a calma de ampulheta,
a vida e o anseio ressurgem

sorrindo com cicatrizes, ternuras
e um abraço sem dar, infindo,
a quem permaneceu em mim

(scs, 27414)

de saudades

1.
escondi-me
entre
tantos
pensamentos
sem
cor

2.
sonhei-nos
em
noites
acordadas
de
tédio

3.
as
imagens
fugiam
covardes,
em
silêncio

4.
e
tudo
parecia

parecer
irreal

5.
como
nuvem
desfeita
como
suspiro
envergonhado

6.
arrastam-se
lembranças
brancas
congeladas
de
incertezas

7.
muitas
badaladas
e
nenhuma
presença
ainda

8.
meras
imaginações
desejos
de
que
fossem

9.
e
pouco
resta
de
tanto
despertar

10.
alguém?

a
resposta
sempre
vazia

11.
mas…
talvez
não
fosse…

desejo

12.
um
estar
aqui
como
sempre
estaria

13.
eram
promessas
escritas
na
pele
quente

14.
os
dias
não
passam:

noites

15.
nas
gavetas
poeira
e
bugigangas:
você!

16.
parece
haver
nova
brisa,
um
rumor

17.
linda
(final
de)
tarde
sem
chuva

18.
sussurra
retornos –
coração
estremece
de
angústias

19.
passos
silenciosos
apressam-se
com
malas
vazias

20.
o
abraço
tão
eterno
quanto
ontem

____

(Se você quiser entender a forma poética aldravia e a aldavipeia, clique aqui e aqui.)