poesia brasileira em cores (Constance von Krüger)

Deixe-se colorir poeticamente.

colorido

Em um país de mistura étnica e cultural tão acentuada, toda a produção artística está sempre composta por influências advindas das mais distintas fontes. O Brasil abriga um mosaico de “existires” tão rico quanto prosaico, tão intenso quanto facilmente ignorável – as vibrantes características de nossa bossa mesclada já fazem parte de nosso cenário habitual, já é trivial conviver com a riqueza e a explosão das manifestações do que somos. Difícil, porém, é descrever tal fenômeno, mas as cores, talvez, sejam as melhores ajudantes nesse processo. Um arco-íris é o Brasil, se cada cor puder significar uma enorme gama de construções das mais diversas escolas e inspirações, onde o grafite marginalizado muito se assemelha às já clássicas obras modernistas, onde o rap da nova geração dialoga com a tão pomposa MPB.

Em termos de poesia, como não poderia deixar de ser, somos vitrine do que há de melhor em várias perspectivas. E é nessa nuance que podemos tomar um exemplar para cada cor que compõe nosso arco-íris. O significado das cores? O mais clichê possível. O importante é vislumbrar, sob nova ótica, o colorido vasto e mal (ou bem) definido da nossa nova, velha e eterna produção poética.
Eis, portanto, as cores de nossos poetas, todos rigorosamente escolhidos sob nenhum critério específico.

O VERMELHO – Ternura, Vinícius de Moraes

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor
seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos

O LARANJA – O guardador de águas, Manoel de Barros

Assim,
Ao poeta faz bem
Desexplicar –
Tanto quanto escurecer acende os vaga-lumes.

O AMARELO – Da felicidade, Mário Quintana

Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!

O VERDE – Cortar o tempo, Carlos Drummond de Andrade

Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.

O AZUL – Poeminha amoroso, Cora Coralina

E eu,
quero te servir a poesia
numa concha azul do mar
ou numa cesta de flores do campo.
Talvez tu possas entender o meu amor.
Mas se isso não acontecer,
não importa.

O ANIL – O bicho, Manuel Bandeira

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem

O VIOLETA – Dois e dois são quatro, Ferreira Gullar

– sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade pequena.

No presente artigo, as convenções para cada cor adotadas foram as seguintes: Vermelho é amor, paixão. Laranja é criatividade, amarelo, alegria. O verde é a esperança, o azul o transcendente, e o anil a intuição. O violeta é a consciência. Deixe-se colorir de poesia brasileira, ainda que ressignificar cada cor, ou cada poema, seja necessário.

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