só quem tem minha alma
sabe a dor que sinto
Frio
dois corpos
tão nus
estendidos
lado a lado
desconhecidos
sem luz
dois corpos
pronomes
te vejo
pronome oblíquo
por vezes tão obtuso
sem nome
na vida
inóspito deserto
o amor é
oásis
(scs, 191010)
Nunca mais
eu reencontrei um sorriso
no meu rosto
desnutrido, esquecido
quase irreconhecível
tomei-o com cuidado,
temeroso de quebrá-lo
fiz-lhe respiração boca a boca
molhei seus lábios com chuva
ele se contorceu um pouco
– parecia sentir dor –
tentou balbuciar qualquer coisa
– seria uma despedida
ou uma canção de amor? –
mas não pôde, não quis
ocultou-se de novo
e nunca mais o vi.
(scs, 29511)
sem título
Há dias
em que o dia seguinte
sempre é
ontem.
(scs, 31811)
Brasa
Teu sorriso nasceu
antes do Sol,
mas eu não vi.
Tua mão lançou
sementes à estrada,
mas eu não sorri.
Tua risada alegrou
a tarde oculta na névoa,
mas eu não quis desfrutar.
Teus cabelos agarraram
perfumes e flores do bosque,
mas preferi esquecer.
Teus sonhos cantaram
sobre um lago e seu luar,
mas eu ignorei.
Teus olhos brilharam
com as nuvens e os ventos,
mas eu me magoei.
Teus suspiros celebraram
a brasa e o calor à noite,
mas eu fugi.
Teus passos te levaram
para sempre para longe,
então, eu me arrependi.
(sp, 19611)
culto em Paraty
Uns poucos.
O pequeno rebanho
do grande Deus.
Voz rouca,
voz louca,
uma só voz
ao Único.
Mesmo com olhos que não vêem
há visão do que a carne não vê
e o grande Deus
fala
na boca simples de quem O teme.
E os visitantes
são de casa
são a Casa
com todos no inefável vínculo do ágape.
Milagre. Mistério. Zoé.
(p, 18911)
silêncio
tenho zumbido nos
ouvidos
que me acompanha por
boa(?) parte da vida
hão há silêncio dentro de mim,
mas coro com
pensamentos
vozes gritos lamúrias
sonhos idéias ideais
lembranças torturas
sorrisos passados
imagens névoa
músicas
e um ruidoso silêncio
que não quer calar
(p, 19911)
Escudo português
Amizade
não se compra com
1 escudo português.
No pescoço, porém,
o escudo fala da amizade
que há –
que é só contigo –,
que é escudo
para o coração.
(p, 19911)