paisagem tardia

Sentado na ampla varanda do apartamento
— muito grande, bem mobiliado,
com vista para tantos outros prédios
de apartamentos vastos,
que conseguem abrigar vastas solidões,
grandes famílias de pessoas desconhecidas —
olhava para o céu poluído,
sem pássaros,
arranhado pelo barulho de buzinas e mortes,
de crianças no parquinho de cimento-sem-árvores,
um céu sem nuvens, só fumaça, cinzento,
como a vida nos vastos apartamentos.

Levou a xícara de café frio e amargo aos lábios.
Sentiu gosto de fuligem, da vastidão do frio,
dos lábios que não estavam.

Parou o gesto no ar
sem pássaros, sem paixão.
A xícara tremeu um pouco
e foi descansada na mesinha sem pires.

Não havia mesinha nem pires
para um céu tão triste
e um vasto vazio tão amplo.

Só restava fechar os olhos
e esperar

(scs, 4612)