em pó

era madrugada
de um sabor sem esperança nem remorsos
eu, linda, olhava pela janela esperando
teu aviso que nunca vinha

ainda

uma tensa calma
se agitava nos meus cabelos, translúcida,
nas veias e antevendo aquele tempo
que eram memórias e sonhos

insones

convulsionada em ardor
escondi o rosto do vento surdo
recusei meu nome e te quis solto,
inquieto borrão de saudade

amarga

a cortina escura
encobriu o nada que eu via,
linda, o canto roubado dos lábios
e desfiz-me em pó e em solidão

contigo

(scs, 11514)

ainda a espera

a música não fez companhia
à voz rouca de silenciar

a luz pela janela mal escondida
encontrou mãos abandonadas

nenhum ruído amparava o sussurro
não-dito, envolto em tola esperança

os cabelos calados de movimento
eram um pedido ansioso na solidão

do mundo-seu desamparado em dor,
brancas paredes de más notícias

onde, no corredor? atrás de portas?
almas bondosas, mas frias, outras

transitam, apenas, fazem, dizem, somente,
e nada acalenta, afaga, ergue

a espera, então,
ainda a espera.

(scs, 19713)

dois

parada na calçaDa
o último ônibus nãO chega
mas, ainda assim, ri baixinho,
– cobre o Rosto com o lenço de seda,
presente que não queria Devolver: a lembrança
semprE havia mais uma noite
e a mesma espera, agora infeliz –,
pois não queria voltar ter de voltar
porém, tinhA de.
por isso, talvez, ria sem pensar no
descarinho de não se sentir Melhor
(seria possível um dia ser outra vez?
como o ontem, o domingo que passou tão rápido,
abandonado de marcas e Abraço?)
o ônibus chegou. atRasado. mas ele veio.

(scs, 3613)